Tuesday 24 February 2015

Requerimento de legislação para atenuar a crise econômica brasileira

(Cópia da carta enviada ao presidente da câmara dos deputados, Deputado Eduardo Cunha, nesta data)


Boa noite, Presidente,

Tem algo que me incomoda muito na crise econômica brasileira e no seu diagnóstico.
Um país que fez por 15 anos superávits primários acima de 2,5%/pib, acumulou US$ 375 bilhões em reservas cambias e tem um regime de câmbio flutuante, não tem um problema primordialmente fiscal e de financiamento da divida soberana doméstica ou externa (os problemas são outros, mas isto é uma conversa bem mais longa).
Uma forma de deixar isto claro para os agentes econômicos seria através do uso de parte das reservas cambiais na recompra de toda a dívida externa soberana emitida em moeda e/ou jurisdição estrangeira (por volta de US$ 40 bilhões). 

Alguns benefícios evidentes seriam:

1) A queda do nível do chamado "risco Brasil". Este é derivado dos níveis de preços negociados nos títulos da dívida externa do Tesouro Nacional. Sendo resgatados, os títulos residuais seriam negociados a valores substancialmente mais altos.

2) O rating das agências de avaliação de crédito são determinados diferentemente para a dívida em moeda local e em moeda estrangeira. As obrigações em moeda estrangeira são naturalmente mais arriscadas do que aquelas emitidas na moeda soberana. A extinção da dívida externa pública tornaria irrelevante a classificação de risco da dívida externa.

3) Provavelmente parte relevante do capital hoje alocado em títulos do tesouro nacional seriam redirecionados para títulos de empresas privadas brasileiras, estimulando a captação externa e aliviando a grave situação financeira de várias destas empresas. 

4) O Ministro Levy tem exposto como meta principal de sua politica a redução da divida bruta do tesouro. Usando as reservas internacionais para recompra da dívida externa a divida bruta cairá na mesma proporção desta recompra.

5) As reservas rendem perto de 0,10% ao ano enquanto que o passivo externo nacional "paga" perto de 7,0% ao ano . Esta recompra seria economicamente lucrativa para o Tesouro Nacional.

6) Parte relevante da dívida externa é de propriedade de investidores brasileiros com recursos no exterior. Eles tem o privilégio de receber remunerações atraentes dispondo de farto conhecimento dos riscos envolvidos. Na ausência desta alternativa de investimento provavelmente muitos investidores procurariam alternativas de investimento na economia real do Brasil.

7) Dívida soberana emitida em moedas e/ou jurisdição estrangeira é foco recorrente de crises nos países em desenvolvimento, além de atentar contra a soberania econômica. Como hoje não há qualquer necessidade econômica de financiar o orçamento federal através de dívida externa, a soberania é subtraída sem oferecer nenhum benefício em troca.

Parece-me ofensivo à nação que a gestão da dívida externa esteja sob responsabilidade de funcionários subalternos do Tesouro Nacional, que jamais levam em conta as implicações políticas e mesmo econômicas de seus atos. Neste sentido, parece-me oportuno uma intervenção do congresso nacional no sentido de limitar os graus de liberdade do poder executivo na gestão de endividamento externo, primeiro através de uma legislação genérica colocando impedimentos rígidos ao endividamento externo em quaisquer circunstâncias, e em segundo lugar, oportunisticamente, obrigando o executivo a implementar um programa consistente de extinção, na medida do possível, do montante existente em dívida mobiliária externa.

Grato pela atenção,

Joca